Outro dia, numa maratona de filmes a que me
submeti sozinha, assisti a dois longas metragens que me fizeram pensar no
quanto eram díspares por apresentar universos simbólicos tão opostos e no quanto esses mundos enunciavam sobre as nossas próprias realidades.
Enquanto em um – Terapia de Risco (EUA, 2005),
direção de Steven Soderbergh – a realidade fílmica era constituída por um leque
de personagens no qual todos apresentavam uma integridade moral e humana
absolutamente permeável; no outro - O Fabuloso destino de Amelie Polain (França,
2001), direção de Jean-Pierre
Jeunet - o universo simbólico era composto por personagens
dotados de certa aura de ingenuidade que beira a mais inatingível (?) utopia da
realidade.
Em Terapia de Risco, até quem parecia o mais
nobre dos personagens, vivido por Jude Law, acaba a estória como um psiquiatra
que utiliza das chancelas profissionais inerentes à sua função para se vingar
de uma ex-paciente que tentou lhe prejudicar. No outro extremo, até o menos
benevolente personagem de Amelie fecha a trama como alguém que tinha aprendido
a ser (um pouco) melhor.
Em breve resumo, para nivelar o raciocínio
aqui proposto, Terapia de Risco é um enredo que trata do opaco mercado dos
remédios de tratamento para a cura da depressão. Assim sendo, desvela todas as
teias de relações, mais referentes a poder e dinheiro do que a preocupações com
a saúde, que esse tema envolve. Em consonância a tal contexto, os momentos
cênicos que abarcam iluminação, cenários e movimentos de câmera instigam no
espectador as mais sombrias e angustiantes sensações.
Por outro lado, Amelie, a personagem
principal que nomeia o longa, tocada por uma epifania mais mundana do que
transcendental - por mais paradoxal que essa definição acabe sendo -, compreende que deve mudar a realidade que a rodeia , criando
situações que façam as circunstâncias da vida de seus conhecidos adquirirem
contornos mais coloridos. A grande contradição de Amelie se forma devido à sua
completa disposição para arquitetar acontecimentos que promovam melhorias na
vida dos outros contraposta à absoluta parcimônia, que beira a inércia, quando o assunto é a busca de sua própria felicidade. Para mim, essa é a principal
característica incongruente da personagem que dá o verdadeiro fôlego ao filme.
Alinhada a essa temática pueril, a textura do
longa francês nos apresenta cenários coloridos em uma bela fotografia, cujas cenas têm um
ritmo rápido e montagem dinâmica.
Como semelhança, as duas tramas têm a
fidedignidade aos universos simbólicos que propõem representar. Em ambas, os
personagens são redondos e bem desenhados, e, por isso mesmo, instigantes. A
comparação desses filmes também se faz relevante porque os dois sublinham bem as
evidentes diferenças que existem entre o cinema europeu e o norte americano.
Ative-me a ser rasa quanto à análise e
exposição sinóptica dos filmes para dedicar mais à comparação desses que podem
ser dois mundos aplicáveis à realidade de cada um de nós. Em qual universo você
prefere fazer uma imersão? A vida é sempre o produto de suas escolhas.
A minha indicação musical da vez é proposital: evidencia em qual universo simbólico eu decidiria viver: